domingo, 31 de março de 2013

A Moça, as mesas e os guardanapos



Rogério é um cara tímido, na verdade, terrivelmente tímido. Foi convidado para participar de uma festa de aniversário e sentou-se sozinho. O salão está lotado. A única mesa que tem lugares vagos é a dele. Para sua sorte, ou seu azar, não chega mais ninguém. Parece que todos que confirmaram presença já chegaram. Sua única companhia é o garçom que serve sua mesa. Assim mesmo, quando aparece, pois Rogério tem vergonha de chamar.
Próximo da meia-noite, uma bela moça, ao contrário da Cinderela, veio ao encontro das doze badaladas. Todos pararam para admirar tal beleza exuberante que floriu o ambiente, inclusive Rogério, que embora introvertido, não é cego. Discretamente, ele estica o pescoço para uma melhor visão.
Ela olha para um lado, para outro, dá alguns passos, esquiva-se de alguns approaches, sorri para algumas gracinhas e é gentilmente abordada pela promotora da festa. Esta explica que a única mesa com lugares disponíveis é justamente a do Rogério. Ambas se aproximam, e a promotora explicando que não há mais lugares pergunta se ele se importa. Mesmo com a batida de seus joelhos sincronizada com a dos dentes, ele consegue sorrir e permite a companhia.
– Está com frio? – ela pergunta.
– Um pouco.
– Meu nome é Luana e o seu?
– Rogério.
– O que faz?
– Sou analista de finanças de uma transportadora.
– Legal. Trabalho com comércio exterior.
A noite vai passando e Rogério consegue se soltar um pouco mais, sorri, dá gargalhadas e até dança. Para quem queria ir embora mesmo antes de chegar, a noite está rendendo. Porém, como tudo na vida passa, principalmente uma noite maravilhosa, Luana levanta-se para ir embora. Rogério oferece uma carona, mas a linda princesa veio com a sua carruagem, quer dizer, seu carro. Ela olha para ele com ternura, beija-o no rosto e escreve no único objeto sobre a mesa, um guardanapo. Dá três passos para trás, mais um sorriso, vira-se e sai devagarinho transformando o trajeto da mesa até a saída numa passarela. Somente quando ela sai do seu campo de visão é que Rogério consegue ler o que estava escrito:
– Rogério: Adorei te conhecer.
Ela também escreveu o número do telefone.
Imediatamente ele passa o número para a agenda de seu celular, mas mesmo assim, guarda o papel como relíquia e só pensa em dormir feliz.
O que ele não percebeu foi que seu amigo, ou melhor, amigo da onça, Júlio André, ficou observando a noite toda. Rogério mal se levanta para ir embora e Júlio André o aborda.
– Ai moleque, que sorte a sua. Um mulherão daqueles na tua mesa.
– É, você viu?
– E como não? Quem não conhece a Luana? Tremenda gostosa ai.
– Ela me deu o telefone.
– É mesmo?
– Sim. Escreveu no guardanapo.
– Mas, você não vai pega ela.
– Pegar? Sair com ela, você quer dizer?
– Tanto faz, ela não vai querer.
– Isto é ela quem decide, não acha?
– Você vai ver. Eu sei onde ela almoça e amanhã eu vou roubá-la de você. Quer apostar?
– Não. Mesmo sabendo que vai perder, este tipo de coisa não se aposta.
– Então vai ver.
No outro dia, Júlio André faz tocaia no restaurante de costume da Luana, se apossa de uma mesa e espanta todos os candidatos que lhe fariam companhia. Para quem se aproxima, ele diz:
– Ocupada. Ta ocupada. Estou esperando alguém.
Quando Luana entra no recinto, ele a chama.
– Luana! Luana! Aqui tem lugar.
De tanta insistência ela senta.
– E ai?  Tudo bem? – perguntou ele.
– Tudo bem e você?
– Pois é. Eu vi você na festa ontem. Estava muito gata.
– Obrigada.
– E o Rogério te chateou muito, aquele mala?
– Claro que não – risos – ele é uma gracinha.
– Uma gracinha? – gargalhadas – ele é um mala sem alça. É meu amigão, mas um coitado, muito sem graça.
– Não pareceu.
– É porque você ainda não conhece ele.
– Mas a noite foi muito agradável.
– Então espera para conhecer melhor – muitos risos.
Após o almoço e tantas detonações no Rogério, o atendente vem até a mesa e retira tudo menos o guardanapo embaixo da mão de Júlio André que o segura, e propositalmente bate com os dedos como se estivesse tocando piano com apenas uma mão querendo chamar a atenção de Luana para o pedaço de papel.
Ela pede licença, levanta-se, puxa o guardanapo tirando-o de Júlio André, escreve algo, vira-o para baixo, curva-se em uma pose bem sensual, solta um sorriso, faz biquinho, leva a mão até a boca e atira um beijo para ele. Dá três passos para trás, mais um sorriso, vira-se e sai rapidamente.  Ao vê-la partir, Júlio André feliz da vida, vira o guardanapo onde está escrito: Babaca.

47 comentários:

  1. Eu adoro as suas narrativas, é possível sentir o texto, entrar na cena e acompanhar a história quase como se ela fosse uma memória nossa, cheia de detalhes. Os desfechos também são ótimos, você escreve muito bem.

    Todas as coisas que o Júlio André disse a respeito do Rogério se aplicavam mais adequadamente a ele mesmo. Gente que acha que pode se dar bem detonando outras pessoas realmente merecem o adjetivo Babaca.

    Ótimo texto.
    Beijos
    semprovas.blogspot.com

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    1. Oi Mayra, obrigado. Pior que existem muitos Julios Andrés por ai.

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  2. Silvio Amaral: Hahahaha... Chupa, Julio André!!!

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    1. Ele merecia sim Lucimar, este personagem é muito mala.
      Obrigado.

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  4. Um babaca mesmo, as mulheres gostam de homens naturais...que não forçam situações.

    Beijos, Cláudio!

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    1. Isto ai Lu. É importante deixar as coisas rolarem sem forçar a barra e sem detonar os outros.

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  5. MUITO bom, teu conto! Esperava uma atitude como essa de Luana. Mulheres sabem com que homens estão lidando. Como sempre um ótimo humor, cheio de desconcentração.

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    1. Foi se o tempo que a mulher era boba, ou melhor, se fazia de boba, agora estão mostrando a força.
      Obrigado B.

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  7. Adorei! :)

    Com um "amigo" desse, ninguém precisa de inimigo...

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    1. Que bom que gostaste.
      Este Júlio André relamente não é amigo de ninguém.

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  8. Amigo da onça mesmo, bem feito. Júlio André, um babaca sem dúvida kkkkkkkk

    Oi Claudio, já postei o final da história, não perca hein rsrsrsrs

    http://inspiracaoentrelinhas.blogspot.com.br

    Beijos!!!

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    1. Não perdi Zane, já li e comentei.
      Existem mais amigos da onça por ai, ainda bem que também temos muitas Luanas.
      Beijos

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  9. Hahaha! Eu ri! E não esperaria comportamento diferente de uma dama!Ótimo texto!

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  10. haha, AMEEI!!
    Incrível como seus textos me prendem a atenção. Deverias escrever um livro de crônicas.
    bjs
    http://oicarolina.wordpress.com

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    1. Prentendo escrever Carolina, mas precisa de grana, as editoras não dão moleza.
      Obrigado.
      Beijos

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  11. Bem feito pro Júlio André, haha. Ótimo texto.
    Já pensou em ter um conto publicado em um livro, lá no blog, no post de hoje, falei sobre um livro que a editora Andross vai lançar com contos de diversos autores com o tema "animais de estimação". Quem sabe você se interessa. petalasdeliberdade.blogspot.com

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    1. Opa, já respondi acima. Penso em escrever sim e já copiei o link da Editora. Tenho uma história para contar.
      Obrigado.

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  12. Suas narrativas são ótimas e bem elaboradas e bem criativas. Adoro vir aqui ler ler ler ler e ler mais so para admirar suas narrativas. Claudio tem que escrever um livro de narrativa e vou ser o primeiro a comprar.

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    1. Puxa Rodrigo, que elogio. Como disse acima quero sim escrever um livro. Preciso juntar capital;
      Obrigadão.
      Abraço.

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  13. Muito bacana! É sempre bom ver (mesmo em uma história) um babaca que se acha levando um toco de uma mulher bonita.
    Como sempre, seu conto ficou muito bom e cheio de humor.

    Abraço!

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    1. Ricky, a estória é fictícia, mas o pior é que o personagem é baseado em um babaca real. Claro que o nome não será revelado para ele não ser apedrejado. He he he

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  14. Oi Claudio! Estou passando para te desejar um lindo fim de semana e me deparo com esse texto...sou só risos...mereceu o nome de " Babaca" você faz isso muito bem, adoro ler tudo o que você escreve...
    Beijos
    Marilene

    Blog/marilene folhasFloreseSutilezas

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  15. Super legal...
    Suzana Rosa - www.rosachiclets.com.br

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  16. Olá Claudio tudo bem?
    Gostei do texto, porque é exatamente isso que uma MULHER de verdade diz a um bobo da corte que se acha muito, parabéns belo final, gostei.

    Tenha uma ótima semana!

    Abraços
    R e M

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    1. Obrigado.
      Concordo contigo, Pior que só existem caras assim porque há mulher que gosta, mas a Luana não - rsss.

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  17. Oi Claúdio, tudo bem?
    Viajando pelo mundo dos meus amigos blogueiros, encontrei o seu cantinho.
    Gostei do que encontrei. Vou ser seu seguidor.
    Lindo e engraçado texto.
    Babaca: por aqui chamamos de estilo pegador. mas que não pega nada, nem dengue.
    Acho encantador mulher que se valoriza.
    Um abraço.
    Ótima e abençoada semana.
    Espero a sua vista.

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  18. Serve de exemplo pra quem se acha o melhor...

    Estou lhe seguindo!

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  19. toma! kkkk
    adorei o texto, final surpreendente!

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  20. Olá, Claudio.
    Excelente narrativa; pena que, na vida real, muitas vezes pessoas cheias de más intenções como estas acabam se dando bem.
    Abraço.

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  21. Boa noite amigo Cláudio.
    Você tem uma habilidade especial com as palavras, um dom especial. Gosto muito de suas produções com sua forma envolvente e bem humorada de descrever situações cotidianas.
    Passei para agradecer sua gentileza e atenção.
    Um grande abraço,
    Abigail (Cantinho da Biga)

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  22. Gostei muito do texto!
    Foi muito legal ir imaginando como acabaria e me diverti muito com o final!
    O Júlio André mereceu!

    ...beijinhos***

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  23. Existe tantos Júlios Andrés nesse mundo que se acham o garanhão e na verdade são os babacas, por isso prefiro ser um Rogério, cara tímido.

    http://www.arthur-claro.blogspot.com

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