domingo, 23 de fevereiro de 2014

Prova de Física

Na escola, onde fiz o segundo grau, era de praxe nós, os alunos, ficarmos na escadaria em frente ao prédio esperando o sinal tocar para entrarmos nas salas de aula.
O professor Vitor, de Física, chegava dirigindo seu “Opalão” e estacionava bem em frente ao colégio. A rua é pública, mas a vaga dele sempre estava livre. Parecia que aquele espaço era de sua propriedade.
Antes de desligar o carro, ele apertava o botão para baixar a antena elétrica, pois ainda não existiam as antenas que baixavam ao desligar o rádio, tão pouco antenas internas como as de hoje. Após sair do carro, com seu tradicional óculos escuros, ele abria o porta-malas do Opala de onde tirava uma pastinha de executivo, no formato de caixa de álbum de fotografia, naquele tempo chamada de 007 por causa do James Bond da época, que usava uma igual com suas armas e seus segredos.
A galera achava a maior graça naquele ritual porque uma pastinha, de tamanho insignificante comparado com o imenso porta-malas do Opala, não tinha motivos para não ficar em cima de um dos bancos, pois assalto era muito raro naquele tempo.
A peculiaridade do professor não parava por aí. Em dia de prova, além de levar o jornal para ler enquanto a fazíamos, ele exigia apenas as respostas sem precisar mostrar o desenvolvimento das questões. Porém, não em uma folha comum. Ele próprio fornecia o material.  Eram folhinhas de mais ou menos 10 x 15 cm muito parecidas com as de um bloco de recados de papel reaproveitado. Ele pedia para que dobrássemos duas ou três vezes e depois para abrirmos. Isto qualquer um pode fazer para ter uma ideia de como era. Com duas dobras a folha fica com quatro divisões, se forem três formam-se oito. Assim a folhinha ficava com o número de divisões compatível com a quantidade de questões que ele passava para o teste. Nós tínhamos que colocar somente as respostas da esquerda para direita e de cima para baixo com o nome bem em cima.
Tratando-se de prova de Física, as repostas eram somente números e complementos como tempo, distância, velocidade, etc. E se você não aguentou a curiosidade e já dobrou a folhinha, percebeu que dava para colocar um número com um tamanho que possibilitava a visão do outro lado da sala. 
Outro fato interessante é que durante a prova o professor não tirava seus óculos escuros.
Havia mitos que o ele furava o jornal e através dele ficava olhando para pegar os coladores. Porém, a verdade é que nunca se soube de alguém que tenha sido punido nas provas de Física, e a colação era generalizada. Se verdade for que ele usava o jornal furado, certamente era para se divertir.
Na época, não recebíamos notas e sim os conceitos abaixo com respectiva equivalência numérica:
I -         menos que 5   - Insuficiente
S -       de 5 a 6,9        - Satisfatório
PS -     de 7 a 9,4        - Plenamente Satisfatório
E -       de 9.5 a 10      - Excelente
Na minha turma tinha dois colegas do tipo aluno modelo, o Charles e o Victor Hugo. Este, xará do professor com a diferença da letra C no meio do nome, é meu amigo pessoal embora a vida nos tenha colocado cada um para o seu lado. O Charles era o aluno que todo professor se orgulhava, além de inteligente era muito dedicado.  Em 15 matérias tirava 14 E e um PS. O Victor também era um aluno exemplar. Não tinha tantos Excelentes quanto o Charles, mas obtinha notas muito acima da média.
Eu era um aluno da média. Talvez um pouquinho acima daquele que estudava o suficiente para passar. Em algumas matérias passei no limite.
Porém, um dia, em uma prova de Física me deu um branco. Nada que eu estudei ficou na cabeça e para meu desespero total o professor chegou.
Era um dia quente, mas meus dentes batiam.
Ele solicitou o tradicional afastamento das mesas e distribuiu as folhinhas. Pediu para dobrar duas vezes e deu quatro questões valendo 2,5 cada uma. Eu fiquei parado olhado aquele pedacinho de papel sem ter a menor idéia de que colocar ali dentro além do meu nome. De repente, percebi que, com o arrastamento das mesas, minha posição ficou estratégica. Eu fiquei sentado bem no meio dos dois gênios da aula. E não somente gênios, como também generosos porque estavam colocando as repostas em tamanho facilitado para uma boa consulta. Não tive dúvidas, colei, quer dizer consultei as duas primeiras do Charles e as duas últimas do Victor. Não foi superstição nem técnica.  Assim fiz porque simplesmente a oportunidade foi esta.
Ao recebermos as notas, a maior surpresa. Eles tiraram S e eu E.
Percebi então, que apesar deles serem gênios, eram humanos e também erravam. Caso pouco comum se tratando destes dois, mas aconteceu. E eu que escapei de um zero por ter feito a consulta certa, achei que não teria a mesma sorte novamente. Logo, estudei mais nas outras provas.
O Charles se formou médico e o Victor, maluco como eu, analista de sistemas. 

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Vidas diversas

Um jovem desembarca no aeroporto Salgado Filho em Porto Alegre. Enquanto aguarda a sua bagagem aparecer na esteira, se debruça sobre o carrinho e seus pensamentos se distanciam daquele local e daquele tempo...
Quatro rapazes sentados a uma mesa de um clube reparam quatro moças ao lado.
A paquera começa seguida de sorrisos. Então, Fernando se aproxima...
– Oi. Tudo bem?
– Tudo. Como se chama? – Falou Adriana.
– Fernando. E vocês?
– Adriana, Marcia, Jane e Fábia. E teus amigos?
– Luiz, Ricardo e Dão
– Como? – gargalhadas de todas – por que Dão? – pergunta Adriana.
– Nem queira saber – respondeu Fernando recebendo mais gargalhadas.
Não demora muito para que os outros três se aproximem também. O papo é bem descontraído. Adriana se interessa por Fernando, Fábia por Ricardo e Dão se apaixona por Marcia, mas a química acontece mesmo com Fernando e Jane, que têm um entrosamento mais íntimo e após alguns dias iniciam o namoro.
– Teu amigo tá caidinho pela Marcia, hein?  – Fala Jane.
– Sim. Mas a Fábia arrasta um trem pelo Ricardo – responde Fernando.
– Será que rola?
– Não. O Ricardo não suporta a Fábia. E a Marcia?
– Que nada. Ela acha o Dão um baita metido, mas porque Dão?
– Como estamos namorado eu vou te contar. Uma vez ele soltou um tão fedorento que espantou todo mundo da sala. Aí, começaram a chamar ele de peidão. Como o tempo ficou Dão.
Ela dá risada.
Eles parecem estar apaixonados, mas o namoro dura pouco mais de um ano. A influência negativa de Adriana, que é a líder das meninas, interfere demais no relacionamento. Ela fica revoltada com o desinteresse de Fernando e não suporta ver a sua amiga com ele. Então ela consegue separar os dois.
Fernando e seus amigos ingressam na universidade.
Ele se relaciona com outras garotas, mas nunca esqueceu Jane, que também nunca o esqueceu.
Eles se encontram em baladas e ensaiam reatar duas vezes, mas não acontece. A nova vida de Jane não tem nada a ver com a do Fernando.
Os meninos se formam e as meninas descambam em uma vida desregrada.
Fernando se qualifica para um grande projeto em Minas Gerais e ao se despedir, um dia antes, se assusta com o estado deplorável de Jane. Magérrima, com cabelos despenteados, olheiras e roupas sujas, Jane nada parece com a menina que ele sempre amou.
No dia da viagem, ela vai ao aeroporto para mais uma despedida, mas quando o vê acompanhando de sua namorada Greta, fica observando de longe.
Fernando embarca sem perceber que Jane está lá.
Em uma das baladas frequentada pelo quarteto feminino, Ricardo encontra-se casualmente com elas. Adriana, outrora apaixonada por Fernando, nesta noite se entrega para Ricardo e engravida. Devido a vida promíscua que ela leva, ele não crê que o filho seja seu e ela não exige o DNA. Seu pai era rico e lhe deixou uma gorda herança. Porém, ela não tem a menor condição de cuidar de uma criança. O nenê é criado pela sua irmã Bruna.
O tempo vai passando e a vida das meninas fica cada vez pior. Adriana só não acabou com sua herança porque Bruna conseguiu uma interdição e libera o dinheiro aos poucos. Jane não para em emprego algum assim como Marcia. Fábia nunca trabalhou.
Marcia é a única que mora com os pais. As demais moram juntas e vivem com o pouco que conseguem somado ao que a Adriana recebe de sua irmã. Entretanto, não largam as drogas. Jane ainda tem assistência da família, mas Fábia foi abandonada totalmente. Após ter invadido a casa de seus pais, enquanto os mesmos estavam na Europa, e ter roubado todos os pertences, a relação entre eles ficou impossível.
De todas, Fábia é a que apresenta o pior estado de dependência química.
Luiz, Ricardo e Dão criam uma empresa de Engenharia e convidam Fernando para ser sócio, mas neste momento ele está muito bem no projeto e também em um novo relacionamento amoroso, com Sandra. A distância e os pensamentos em Jane não permitiram que ele continuasse com Greta.
Em uma de suas loucuras amorosas Marcia engravida. Ao se desesperar, procura por Adriana que já passou por esta experiência. Porém, Adriana era, na ocasião, independente e Marcia precisa dos pais. Estes são muito tradicionais e ela sabe que terá problemas, então decidem tirar a criança. Adriana, devido a interdição não tem muito dinheiro disponível, então elas procuram uma clínica clandestina.
O procedimento dá errado e Marcia tem complicações. Com medo e vergonha ela demora para procurar um médico e quando o faz é tarde demais, Marcia falece.
A notícia é desesperadora para as amigas. Elas descarregam a tristeza com mais drogas.
Alguns dias depois, apenas Jane parece mais conformada. Adriana é a líder do grupo, mas era Fábia que tinha mais sentimento por Marcia. Fábia se envolve com drogas mais pesadas.
A situação começa a ficar insustentável porque pertences começam a sumir do apartamento.
Elas brigam e Fábia sai de casa e vai morar na rua.
Jane tenta convencer Adriana a mudar de ideia, mas ela é irredutível.
Adriana que nunca esqueceu Fernando o procura nas redes sociais e o encontra. Conversam muitas vezes. Ele a aconselha sair da vida que leva. Ela responde que largaria por ele e se declara. Ele diz que não corresponde e que é uma pena ela estar estragando a sua vida desta forma.
Jane chega e pega o fim da conversa. Elas brigam. Jane a acusa de tê-la separado de Fernando por motivos mesquinhos e pessoais. Ela sai de casa e fica sem rumo. Chega até uma praça, senta no banco e chora.
Após algumas horas, como não tem para onde ir, retorna para casa.
– Tu não podias ter feito isto comigo. Se gostavas dele, por que não o disputou limpamente?
– Eu não fiz nada. Nada aconteceu, eu que me apaixonei. Não controlamos isto.
– Como nada? Tu fizeste a maior campanha contra ele. Eu me deixei influenciar. Sou uma idiota mesmo.
– Não fale assim. Tu és minha amiga, uma irmã. Eu te amo. Isto vale mais do que qualquer homem.
– Mas eu o amo. Poderia ter sido feliz. Eu achava que era coisa de adolescente, mas nunca o esqueci.
– Se for para ser será. Ele gosta de ti. Eu sei. Ele me disse.
– Mas, não dá mais. Nossas vidas mudaram muito, Ele pode gostar, mas não me quer mais.
Depois de alguns dias elas fazem as pazes, mas Adriana continua procurando por Fernando que a bloqueia nas redes sociais, e-mails e ela não tem seu telefone.
Adriana faz uma nova amizade, o Juca, e chama Jane para sair com ela, Juca e seu comparsa Nico. Eles são de má índole e com extensa ficha na polícia, mas isto parece não ser problema para elas.
Juca desafia outra pessoa para um racha e ambos aceleram os carros atingindo alta velocidade em uma avenida importante de Porto Alegre. São duas da manhã e tudo parece deserto. Juca perde o controle do carro e se choca com um ônibus na outra pista. O airbag de Jane não funciona e sem cinto ela voa pelo para-brisa. Os outros três sofrem escoriações e são levados para delegacia.
Adriana é liberada e corre para o hospital para onde Jane foi removida. Ela foi impedida de entrar pelos familiares de Jane, mas soube que o estado é muito grave.
Semanas passam...
Já sem aparelhos, Jane continua em coma. Adriana sabe que quanto mais o tempo passa menos chance Jane tem de retornar.
Caminhando sem rumo, Adriana encontra Fábia dormindo sob uma marquise. Ela a chama, mas Fábia não a reconhece e ainda a xinga. Ela liga para a casa dos pais de Fábia, mas estes desligam o telefone em sua cara. Ela procura por Ricardo que a recebe com desconfiança, mas a escuta. Ele intercede e os pais de Fábia a removem para um hospital psiquiátrico. O quadro de Fábia é grave. Devido ao alto consumo de drogas, ela nunca mais será a mesma.
Adriana vai para casa deprimida e se droga novamente.
Em um ataque de fúria quebra toda a casa e depois se joga pela janela de seu apartamento que fica no segundo andar.
Adriana é removida para o Hospital em estado de coma e é operada, mas não resiste a operação.
Primeiro ela ficou como Fábia, depois como Jane e agora está como Márcia.
Os três amigos não atualizam Fernando dos acontecimentos na intenção de poupá-lo, pois apesar de tudo, ele tinha carinho pelas meninas, em especial, é claro, por Jane.
No entanto, o ciclo de Fernando em Belo Horizonte termina. Os projetos acabam bem como seu relacionamento com Sandra e ele retorna para Porto Alegre...
A bagagem demora. Parece que foi uma das últimas a ser colocada na esteira, mas não, ele continua pensativo e nem repara que ela já deu três voltas. Fernando sai do desembarque onde é aguardado pelos seus amigos que o colocam a par de tudo e corre para o hospital.
Ele visita Jane todos os dias e conversa com ela, até que um dia ela aperta sua mão, abre os olhos, diz que o ama, pede desculpas e fecha os olhos para sempre.
É como se ela estivesse esperando para um último encontro.
Ele chora abraçado em seu corpo.
O tempo passa...
Fernando aceita a sociedade com seus amigos, conhece Camila e, finalmente livre do passado, se casa.  

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Fumacinha inocente

Terça-feira, 4 de Fevereiro de 2014, eu estava dormindo muito bem ao lado de minha esposa amada, e as 2h00 da madrugada fomos acordados por um cheiro insuportável de fumaça que invadiu o quarto. A primeira impressão foi de que o fogo era dentro de casa, mas depois que passou o susto, percebemos que era na rua.
Quem acompanha o H. E. e O. P. há algum tempo sabe que somos tão traumatizados com fumaça que não se surpreenderia ao saber que trememos até quando vemos uma vela de aniversário.
Desta vez, não foi tão grave como narrei em Fumacentos, mas o fedor, que era muito sufocante,  nos fez descer e ir para o pátio. 
Nós víamos a fumaça passando e o volume era tão grande que nos desorientava fazendo com que nós pensássemos que poderia ser outro incêndio. Entretanto, o cheiro era inconfundível de capim queimando. Parecia que o “cliente preferencial da loja de chapéu de touro” tinha armazenado a grama do ano inteiro para por fogo naquele dia.
Como não deixo barato, eu troquei de roupa e sai atrás porque percebi que era muito perto. E de fato era na rua de trás, poucas casas além do meu vizinho de fundos.
Dei a volta na quadra, juntei uma pedra no caminho e achei a casa do “marido traído pela esposa umas 50 vezes”.
A casa estava toda aberta, então, resolvi largar a pedra e usar o bom senso, se bem que o filho de uma “mãe possuidora de vários amantes” , não deve ter nenhum.
Bati palmas e ele veio todo amedrontado, pois sabia que tinha feito besteira.
– Pois não? – disse ele.
– Vizinho – querendo chamá-lo de qualquer coisa degenerativa – sua fumaça está sufocando todas as casas daqui para lá – fiz o gesto da direção que a fumaça tomava.
– Ah! Já vou apagar – falou meio bobão e envergonhado sem pedir desculpas.
Nem deu boa noite e nem eu esperei. Nós nos viramos de costas praticamente ao mesmo tempo e voltei para casa.
De fato, o “esposo de uma mulher muito infiel” apagou o fogo.
O cheiro demorou um pouco para sair, mas conseguimos dormir melhor.
O que mais me indigna é que o “pai de uma piriguete de calçada” fez de madrugada porque sabe que é errado. Ele achou que na calada da noite ninguém iria notar. Porém, nós notamos, e da pior forma possível.
Eu já tinha falado de queimadas, no post Verão chegando, antecipando este sofrimento.
Infelizmente as prefeituras não tomam conhecimento e os “sócios do clube de marfim de testa” acham que estão sozinhos no mundo.
No verão, não há dia que eu não sinta cheiro de capim queimando e ninguém faz nada.
Um dia isto vai ter que acabar.
Com a poluição causada pelos produtos que usamos, a quantidade de problemas respiratórios das pessoas aumenta e estes “filhos de uma senhora trabalhadora em uma sauna de moral duvidosa” ainda ajudam poluir.
O meu maior desejo é juntar todas as folhas secas da cidade, marcar a casa destes “filhos de uma mãe leiteira ruminante”, esperar o vento virar contra eles e tacar fogo.
Quem sabe sentindo o gosto, ou melhor o cheiro, do próprio veneno eles poderiam se transformar em pessoas melhores. No entanto, é mais fácil eu virar miss na prisão por causa deste foguinho na rua do que estes indivíduos darem bons exemplos para seus filhos.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Balada


– Bom dia!
– Ai meu Deus.
– O que foi?
– Quem é você?
– Otávio, esqueceu?
– Ah! O da balada de ontem.
– Sim. Quem mais poderia ser?
– É que não lembro de nada.
– Nada?
– Quase nada. Lembro de conversarmos, mas não de vir para cá. Onde estamos?
– Na minha casa.
– É! Eu não lembro de nada mesmo.
– Eu lembro de muito pouco. Lembro que nos beijamos, e muito – risos – mas como viemos para cá, realmente eu também não lembro.
– Que merda.
Foi tão ruim assim?
– Não é isto? É que não lembro nem dos beijos.
– Por estarmos sem roupa, dá para imaginar, né?
– Pior. Espera aí! Você também não lembra de nada, mesmo?
– Nadinha.
– Putz. Que coisa? Nunca fiz isto antes.
– De ir para cama com quem conhece na balada?
– Claro que não. É perigoso, mas também de beber a ponto de ter esta amnésia.
– Bom, Natália, agora é tarde.
– Natália? Nem meu nome você sabe.
– Foi o nome que você me disse ontem.
– Ahh! To lembrando. Eu menti, mas não lembro que foi Natália.
– Porra! Uma surpresa atrás da outra, mas por quê?
– Eu e minha amiga sempre damos nomes falsos no primeiro encontro. Tática, e quer saber – risos – não tinha gostado de você.
– Então por que veio para cá comigo?
– Eu é que sei! Preciso me vestir. Será que transamos mesmo?
– Olha! Só quem transa de roupas é personagem de novela. Estamos sem, é para ter dúvidas?
– Ai meu Deus!
– O que foi agora?
– Camisinha! Será que usamos?
– Não estou vendo vestígios por aqui. Espera ai – ele abriu a gaveta – lamento te informar, mas todas que eu tenho estão intactas.
– Que droga.
– Não te preocupes. Sou super ligado. Só me descuidei com você.
– E se eu engravidar?
– Pílula do dia seguinte?
– Não sei! É contra meus princípios.
– Pior é transar e não lembrar.
– Quer parar de piada?
– É que, já que estamos aqui e não lembramos de nada, que tal...?
– Não gostei de você, esqueceu? Deixa eu me vestir.
– Puxa! Não te fiz nada. E para quem não gostou, os beijos foram bem quentes.
– Desculpe, não to legal. Foram é?
– E como! Eu te levo em casa.
– Não! Eu vou de táxi. Eu preciso avisar a Joice.
– Que Joice?
– A amiga que estava comigo na balada.
– Joice? Achei que era Clarice, isto eu lembro. Ah! Entendi, tática.
– Sim – risos – nós moramos juntas Ela deve estar preocupada.
– Olha! Desculpa. Eu também não lembro de nada. Que dizer, nada fora da balada.
– Tudo bem. É Bárbara.
– Bárbara?
– Sim, meu nome verdadeiro – risos – agora eu tenho que ir.
– Pena! Eu gostaria de te conhecer mais.
– Quem sabe? Eu já estou te vendo com outros olhos.
– Está é? – risos.
– Não te assanha – risos – Cadê meu telefone?
– Talvez no bolso.
– É mesmo, está aqui.
Ao ligar, Bárbara escuta o toque do telefone da Joice, um pouco abafado, mas perto.
Então ela abre a porta do quarto e a vê atendendo sentada no sofá da sala.
– Ué? O que é isto? – falou Bárbara.
– Estou esperando os dorminhocos.
– Você estava aqui o tempo todo?
– Sim, ou melhor, estava com vocês. Saí de manhã cedo porque não conseguia mais dormir.
– Isto tá cada vez melhor – falou Otávio.
– Não estou te entendendo, menino – disse Joice
– É que é uma surpresa atrás da outra e cheio aventuras, além de não lembrarmos de nada.
– Nada? Nadinha? – Espantou-se Joice.
– Nem como viemos parar aqui – completou Bárbara.
– Então sentem, vou lhes contar...
– Nossa Bá – exclamou Joice – esta balada está bombando.
– E tá mesmo. E olha ali este cara está te cuidando.
– Opa! É bonito.
– Ele e o amigo dele estão vindo para cá e eu não gostei muito do amigo.
– Ah Amiga, já te quebrei várias, agora tu precisa me ajudar.
– Tudo pela amizade – risos.
– Olá meninas, tudo bem? Podemos sentar – falou Otávio.
– Claro – respondeu Joice.
– Qual o nome de vocês?  – perguntou Gilberto.
– O meu é Clarice e o dela...
– É Natalia – se antecipou Bárbara.
– Então Natália, vamos dançar? – convidou Gilberto, e ela aceitou para aliviar a amiga.
– Ficamos nós dois – disse Otávio – quer beber o que?
– Uma cerveja está bom.
Depois de algumas cervejas.
– Mais uma? – disse Otávio.
– Não. Deu para minha cota.
– Vamos dançar? – ele a convida.
– Não, prefiro ficar conversando.
Ele se aproxima, a beija e ela corresponde.
Muitos beijos depois, o outro casal volta.
– Já! – Fala Joice 
– Não nos acertamos muito – responde Natália rindo e alterada pela bebida. Entretanto, continuam na mesa. Natália e Otávio bebem muito e Joice um pouco mais.
Gilberto, o motorista da rodada da dupla não bebeu.
Então chega o momento de irem embora.
– Como vieram? – perguntou Gilberto
– De táxi – responderam.
– Nós levamos vocês – disse ele.
– Nada disso – falou Otávio – Vamos lá para casa e beber mais.
– Eu não vou – disse Gilberto – não dá para mim, mas se elas quiserem levo vocês.
... E o papo estava tão divertido, que nós resolvemos vir  terminou Joice.
– Então foi assim que viemos para cá – pergunta Bárbara.
– Sim – reponde Joice.
– E eu não fiquei com ele – aponta para Otávio – e sim com o Gilberto?
– Não minha querida. Você não ficou com ninguém. Não gostou do Gilberto e nem ele de você.
– E como ficamos sem roupas? – pergunta Otávio.
– Simples – responde Joice – Vocês estavam tão bêbados que resolveram fazer um strip e depois deitaram um de cada lado de mim e dormiram. Quando amanheceu eu vim para sala porque não conseguia mais dormir.
– Então não rolou nada? – fala Bárbara aliviada.
– Não. Nadinha.
– Que loucura – disse Otávio – e nós como ficamos?
– Ah garoto, foi gostoso, mas parou por ai. Eu também bebi um pouco e curti. Agora eu e a Bá vamos para casa.
– Não nos veremos mais?
– Pode até ser, mas como amigos, ok?
– Tudo bem. Telefone?
– Pega ai.
Durante todo o pequeno diálogo, Bárbara se manteve calada e pensativa. Ao descerem de elevador ela rompe o silêncio.
– Espera ai Joice, esqueci meus brincos lá em cima.
– Brincos? Eu jurava que ela estava de brincos – pensou Joice.
Ao chegar na porta do apartamento de Otávio, Bárbara aperta a campainha e quando ele abre a porta ela o abraça e beija “escandalosamente”, sorri e vai embora. Otávio fica rindo a toa com cara de bobo.
A noite uma grande surpresa para Otávio, o interfone toca e o porteiro diz que são flores para ele. Ao receber a surpresa, a mesma aumenta mais ainda. Quem traz as flores é a Bárbara acompanhada também de um champanhe.
– Que surpresa – diz ele.
– Imaginei – respondeu ela.
– A que devo a honra?
– Fiquei imaginado como teria sido se em vez de da Joice fosse comigo.
– Acredita que eu pensei a mesma coisa?
– Acredito.
Então eles entraram, beberam, se curtiram e no dia seguinte se lembraram de tudo.