Claudinho era um rapaz pacato e tudo que
procurava era sossego. Saiu da cidade grande para fugir do barulho. Assim foi
para a sua casa de praia cujo local era tranquilo e silencioso. Tudo que ele
queria era ouvir o barulho do mar e o canto dos passarinhos.
Mas, certo dia, não de verão, coisas
estranhas começaram a acontecer.
Claudinho foi acordado por seus vizinhos barulhentos buzinando exageradamente
as 7h00 da manhã, em caravana, para avisar todos conhecidos e não conhecidos
que estavam chegando à praia. Quando ele achou que ia voltar a dormir,
iniciou-se a gritaria dos poluidores sonoros seguido de “bateção” de portas dos
carros e porta-malas.
Como seu merecido sono foi arruinando,
Claudinho levantou-se e foi tomar café. Antes do primeiro gole, passou em sua
rua um caminhão de político pedindo votos com uma paródia ridícula e um volume
ensurdecedor. Nem bem recuperado do susto, outro político resolveu dar o ar de
sua graça com uma musiquinha tão imbecil como a do seu concorrente e um volume
competidor.
Pior ainda era quando um caminhão trafegava
em frente a sua casa e outro na rua de trás fazendo com que suas “melodias
criativas” se encontrassem em cima dele.
De meia em meia hora passavam candidatos a
alguma coisa chamando atenção dos moradores sem terem noção que em vez de votos
eles poderiam levar pedradas. Entretanto, nem este intervalo dava-lhe o único
beneficio que queria, o silêncio. Pois, os recém-chegados abriram o porta-malas
de um dos carros e ligaram o som, e aquilo que curtiam como música era um Funk
da pior qualidade.
O dia foi passando e aquele barulho ia
martelando a cabeça do Claudinho.
Até que enfim, por um milagre, o silêncio.
Então ele pegou um livro para curtir aquele
momento raro. Mas, nem chegou na metade da primeira página, outro vizinho,
repetindo o que fazia todos os dias, soltou seus cães que sempre vinham até a
cerca da casa do Claudinho para provocar os dele. Com isto, ele já estava até
acostumado, mas este dia parecia estar tudo diferente. Os latidos eram de tudo
que é jeito e adentravam sua moradia como se fosse uma guerra invadindo seus
tímpanos. Na mesma hora ele pensou em soltar os seus cães para liquidar os
invasores. Os audaciosos eram pequeninos e somente dois contras os três
“cavalos” dele, logo não seriam páreo. Mas, depois ele pensou melhor:
- Tadinhos, eles não tem culpa da
imbecilidade dos donos. E ainda, os meus poderiam morrer engasgados.
Os pestinhas percebendo o perigo foram embora
e mais um momento de serenidade se instalou no ambiente.
Tudo parecia que o dia ia terminar bem. Os
políticos deram uma trégua, os cães provocadores foram presos, e os “funkeiros”
pareciam ter perdido a euforia.
Mas, de repente, as 21h00 mais uma invasão
sonora. Desta vez foram gritos assustadores. Depois de tentar descobrir quem estava
morrendo, Claudinho percebeu que eram os “ex-funkeiros” que resolveram arrepiar
no karaokê.
Ele não sabia o que era pior: os políticos, a
briga de cães, a buzinação ou esta coisa bizarra e grotesca que estava
acontecendo naquele momento.
Ele nunca tinha visto tamanha desafinação e
gritaria. Pensou:
- Nossa! Eles estão fazendo tudo, menos
cantando. Até uma gralha fanha faz melhor.
O tempo foi passando e o fôlego dos agressores
ao meio ambiente não parava. Quanto mais desafinavam, mais continuavam a cantar,
ou melhor, gritar.
Após quatro horas de tortura e já deitado
tentando dormir, Claudinho deu um grito:
- Ahaaaaaarrrggh!
Ele saltou da cama, vestiu-se rapidamente,
desceu as escadas em um só salto, correu para a garagem. Na passagem pela área
da churrasqueira apanhou os óculos de proteção que estava sobre a mesinha e
colocou. Já na garagem puxou uma enorme caixa da prateleira. Arrancou a tampa
desta caixa e com apenas uma mão e empunhou a motosserra que lá estava guardada.
Com a outra mão puxou a corda da ignição e soltou uma gargalhada mais tenebrosa
do que narrador de filme de terror.
Ele saiu de casa, atravessou a rua, fatiou o
portão do vizinho e se encaminhou para os fundos onde rolava o ritual de
sacanagem aos propínquos. Eles, empolgados com a cantoria medonha e o barulho
do equipamento, não perceberam a invasão do morador adjacente e surtado.
Em respeito aos possíveis cardíacos e as
pessoas sensíveis, vou poupá-los dos detalhes sórdidos. Mas, foi o maior, o
mais brutal, pior e terrível “karaokecídio” que o mundo já soube.
É! Tá bom. Foi o único. Porém, foi muito sangrento.
Coincidentemente a gota final de gasolina se
foi com última vítima. Então, encerrando
o massacre, ele jogou a motosserra contra o aparelho barulhento liquidando com
o som e retornou para sua casa calmamente e aliviado. Ele tirou os óculos e as
roupas sujas, jogou-os na lavanderia, subiu as escadas para tomar um banho e
deitou.
Mesmo ciente que esta poderia ser a última
noite em sua cama, ele dormiu sorrindo.
Na manhã seguinte ele levantou como se
acordara de um pesadelo, iniciou seu café sossegado sem barulho de vizinhos,
políticos, cães e etc. Era o mais puro e invejado silêncio. Silêncio? Ele
entendia a ausência dos “ex-cantores”, mas nem de longe, apesar de não ser o horário
da briga com os seus, escutava os cães chatos. E cadê os políticos que não
davam trégua? Até os seus cachorros estavam em um sono profundo.
Intrigado com o silêncio, ele olha para o
chão da lavanderia e nada encontra. Mas, de relance vê algo e volta o olhar
espantado para as suas roupas limpíssimas penduradas no varal cujo perfume do
amaciante ele sentia de onde estava..
Correu para conferir a motosserra na garagem e a encontra sem
vestígio algum da chacina. Na volta repara os óculos limpinhos em cima da
mesinha. Sem entender pensa:
- Será que eu sonhei? Mas, eu tenho certeza. Foi
tão real.
Um tanto aliviado, retornou para o seu café
quando palmas soaram em frente a sua casa.
Era a polícia.
- Pois não!
- Senhor! Houve um massacre na casa em frente.
Ao que indica foi um ataque de uma serra elétrica. O senhor viu ou ouviu alguma
coisa?
- Não! Apenas barulho de pessoas cantando e
música muito alta.
Ele não poderia se entregar sem ter certeza.
Afinal, as evidências de que cometera o crime não existiam e ele só lembrava até
o momento do banho e ter ido dormir. Só podia ter sido um sonho.
- Tudo bem senhor. Todos os vizinhos disserem
o mesmo. Se lembrar de algo, por favor procure a polícia.
Passado alguns dias, Claudinho convencido de realmente
ter tido um pesadelo e alguém ter executado o seu sonho matutou:
- Será que tenho poderes de premonição? Mas, por que sonhei comigo mesmo? Sei lá!
Mas, que este silêncio está bom, ah isto tá.
Então alguém com voz bem baixinha chamou-o no
portão:
- “Carteeeiro”.
O tom era tão baixo que Claudinho só percebeu
que tinha gente chamando porque seus cães estavam recebendo o rapaz com toda
tradicional hospitalidade canina em recepção aos fiéis agentes da
correspondência.
Ele se aproximou e perguntou:
- Por que não bateu palmas?
- Eu não quis incomodar – falou o carteiro
com voz trêmula que entregou a carta e saiu rapidamente.
Claudinho abriu a carta e leu:
“Caro vizinho:
Obrigado por nos livrar dos
barulhentos.
Ninguém mais aguentava aqueles assassinos
da música.
O senhor foi o único que teve coragem
de fazer o que todos queriam.
Não se entregue, mesmo que todos
saibam quem foi.
Estamos juntos nesta. É o nosso herói.
Até os políticos evitam de passar
perto daqui e o vizinho mala dos cachorros se
mudou correndo esta manhã.
Desculpa por termos invadido sua casa e o
sonífero dos cães.
Precisávamos limpar as provas do
crime.
PS: Por que a motosserra?”
Após ler, ele sorriu e respondeu olhando para
a carta:
- Porque eu não tenho uma metralhadora.
* Esta é uma obra de ficção. Qualquer
semelhança é a mais pura vontade de ser realidade.
rsss adorei amigo.. vc é demais rssss
ResponderExcluirA linha entre a ficção e a realidade, as vezes é muito tênue.....
ResponderExcluirAbração,
A imagem ficou dez..... fala por si só...ótima estória.
ResponderExcluirAbração,
Reparou a marca da mão em sangue no peito do Karaokê Killer?
ExcluirChamun, adorei! um dos melhores textos... ah a foto tb ficou show! Parabéns!
ResponderExcluirPara dar os devidos créditos da foto...
ResponderExcluirCriação: Claudio Chamun
Fotografia: Fabrícia Santos
Claudio, demais, adorei. Se eu precisar posso te chamar com a motosserra ?????? Muito bom, delicioso de ler, parabéns!
ResponderExcluirCarla: Pode chamar sim, mas tu pagas a gasolina - kkk.
ExcluirFantastico, Claudinho.
ResponderExcluirAdorei o blog por sua tamanha originalidade, já estou seguindo e com certeza voltarei sempre para ver novas criações, deixo o convite para que faça parte do meu espaço também, abraço!
ResponderExcluirwww.paullolenore.blogspot.com
Poxa, já fizeram todos os comentários que eu gostaria de ter feito. Mas esse texto é incrível. Esse final me deixou quase sem fôlego. Muito bem bolado, parabéns.
ResponderExcluirRetribuindo a gentileza, já estou seguindo. Gostaria de te convidar a participar de um grupo de blogueiros no Facebook.
Abraços, e te espero mais vezes no STJ!
http://www.facebook.com/groups/amigosblogger/
http://daquioitentaanos.blogspot.com.br/
Morando perto do Jardim Botânico e acordando com os passarinhos é difícil se botar nos sapatos do Claudinho - apesar de que as festas na ESEF me colocam mais perto desse sentimento. Texto bem-humorado e que, com certeza, vai ter milhares de pessoas acenando a cabeça e rindo ao se identificar, porque ao menos um vizinho ruim já deve ter passado pela mente. "Quem com maus vizinhos vizinhar, com um olho há de dormir e com o outro vigiar."
ResponderExcluirAbraço, seu Cláudio.
Tem dias que dá vontade de fazer a mesma coisa (mas seria com um facão).
ResponderExcluirAdorei a crônica!
Adorei Claudio!!! To seguindo suas escritas.
ResponderExcluirCrônica perfeita! Gostei, porque resume toda a vontade que eu tenho com funkeiros e políticos, graças a Deus que as eleições estão acabando HAUHAUHUAHUHUA.
ResponderExcluirEssa poluição sonora incomoda todos. Jamais darei meu voto a quem desrespeita meu sono,e jamais respeitarei pessoas mal educadas que acham que todos devem tolerar seu "gosto musical" e "estilo de vida" Como sempre, adorei seu Post. Abraço.
ResponderExcluirSensacional.
ResponderExcluirkkkkkkkkkkkkkkkk
ResponderExcluirAdorei Claúdio!!!
Muito bom mesmo :D
Abçs
http://blogluminoso.blogspot.com.br/
Que medo de você com essa motosserra.
ResponderExcluirhttp://www.arthur-claro.blogspot.com
Nossa não chegue perto de mim com uma motosserra kkkkkkkkkkkkkkkkk.
ResponderExcluirkkk, agora me veio a ideia de comprar uma motosserra pros meus vizinhos funkeiros, quem sabia eu consiga admiração dos outros ? rs
ResponderExcluirbeijos
Seu cara de pau na noite passada acordei toda suada, porque estava sonhando que matava várias pessoas com uma motoserra em um quarto fechado kkkkkkkkkkkkkk. Que loucura!!!
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