A menina, o sorvete e a lição

        Eu sou muito brincalhão. Sempre brinquei com meu filho que já é um homem e agora brinco com minha filha que é pré-adolescente. E as brincadeiras são de enganar para fazer surpresas como dizer que vamos a outro lugar e ir ao Mac Donalds, lugar que ela adora e outras coisas, pois esta já está manjada.

Por causa destas brincadeiras, no verão passado, eu recebi uma das maiores lições da minha vida.

Eu sempre digo que a gente aprende muito com os filhos, mas nunca pensei que este tipo de aprendizado seria tão cedo.

Sem querer enrolar vamos lá...

Eu gosto de sorvete de coco, minha filha e minha esposa gostam de chocolate. Eu fui ao super e comprei dois potes de dois litros, um de cada sabor.

Com o verão quente, os deliciosos foram sendo devorados até que o delas acabou antes. Claro que com duas pessoas consumindo, mesmo uma sendo criança, acabaria mais cedo.  Porém, não foi tão antes assim, porque naquela época eu era um descontrolado. No entanto, mesmo com toda minha gula, ainda tinha do meu quando o delas terminou.

Certo dia eu me servi e disse:

– É só meu, afinal vocês comeram o de vocês e não gostam de coco.

A minha esposa realmente não é muito fã de sorvete de coco, mas minha filha, apesar de preferir o de chocolate, encara todos. Logo, ela respondeu:

– Pai. Eu gosto de coco, me dá um pouquinho?

É claro que eu daria, e dou, mas resolvi dar uma brincadinha.

– Não. É meu. Vocês já tomaram o de vocês, agora é minha vez.

– Mas eu só quero um pouquinho.

– Só se me der um beijinho.

– Isto não é justo.

– Como não é justo? Acabaram com o de vocês e agora querem o meu?

– Não é justo porque tu tá comendo sozinho.

– É só me dar um beijinho que eu te dou um pouquinho, e olha que está no fim.

– Mas isto não é justo.

– É justo sim.

Cada colherada que eu dava, eu pedia um beijinho e avisava que estava acabando. Aí, ela começou a chorar e nada de beijinho e nada de pouquinho. É claro que eu nunca deixei um filho passar vontade, e nunca vou deixar mesmo que eles tenham 80 anos. O que ela não sabia era que tinha mais no congelador e que eu estava zoando. Que maldade, eu sei. Bom, o sorvete que estava servido acabou e ela continuou chorando e nada de beijinho.

– Perdi a parada – pensei.

Então, servi mais e dei a ela.

– Eu só queria um pouquinho.

– Mas aí tem bastante. É teu. O pai estava brincando. Tem mais lá. Eu só queria um beijinho.

Foi neste momento que eu aprendi uma das maiores lições da minha vida, pois ela disse:

– Eu não acho justo trocar sorvete por um beijinho. Eu posso te beijar quando tu quiseres, mas não trocar por sorvete.

Pois é, aprendi esta.